
Conflitos entre sócios em sociedades 50/50: como evitar a paralisação do negócio
Tatiana Araújo
4 de abril de 2025
Entenda como alguns mecanismos jurídicos são capazes de prevenir impasses decisórios e proteger as sociedades com participação igualitária.
No ambiente de negócios brasileiro, as sociedades empresariais compostas por dois sócios com participações iguais – mais conhecidas como sociedades 50/50 – são bastante comuns. À primeira vista, essa estrutura pode até parecer igualitária e justa, promovendo equilíbrio e parceria entre sócios, mas, na prática, ela pode ser tornar um terreno fértil para impasses e conflitos que podem ser difíceis de administrar.
Os problemas começam com a ausência de mecanismos claros para a resolução desses impasses, que podem, inclusive, levar à paralisação da atividade empresarial, colocando em risco não apenas a sociedade em si, mas também o patrimônio investido pelos sócios, a credibilidade no mercado e o futuro do negócio. A verdade é que muitos empreendimentos promissores acabam dando errado não por falta de viabilidade econômica, mas por falhas na estruturação da governança societária.
Por esse motivo, é extremamente importante que os sócios, desde a constituição da empresa, prevejam no contrato social – e no acordo de sócios – mecanismos que garantam a continuidade da gestão (em caso de empates decisórios, por exemplo) e a resolução eficiente de conflitos. Algumas cláusulas específicas podem evitar disputas judiciais longas, onerosas e nem um pouco saudáveis para o negócio, protegendo a empresa e a relação entre os sócios.
Neste artigo, apresento alguns dos principais instrumentos utilizados para lidar com conflitos em sociedades 50/50, como o voto de minerva, a cláusula de shotgun (buy or sell) e os métodos extrajudiciais de resolução de conflitos, falando sobre como eles podem ser aplicados para preservar a estabilidade e a continuidade dos negócios.
Voto de Minerva: uma solução para prática para resolução de empates
O voto de minerva é um mecanismo que serve para “desempatar” determinados impasses entre sócios que compõe sociedades 50/50, evitando bloqueios na tomada de decisões da empresa.
Uma das características em sociedades em que os dois sócios têm participações iguais é a necessidade de unanimidade para a tomada de decisões, o que pode acabar travando o negócio. É justamente nesse ponto que entra o voto de minerva, como um mecanismo que vai conferir a um dos sócios – previamente estabelecido no contrato social ou no acordo de sócios – o poder de desempatar deliberações e decidir sobre determinados temas da empresa.
A atribuição do voto de minerva pode ser determinada de acordo com o conhecimento técnico de cada sócio. Por exemplo: o sócio A, que tem formação na área de finanças e detém conhecimento profundo a respeito, poderá ter o voto de minerva para desempatar decisões que envolvam esse tema, enquanto o sócio B, que possui formação em marketing, terá o poder de decidir sobre questões relacionadas a esse ponto.
No contexto de uma sociedade limitada 50/50, a ausência de um mecanismo de desempate pode gerar uma situação de paralisia administrativa, prejudicando a gestão ordinária e estratégica da empresa. Assim, a atribuição do voto de minerva se revela uma solução prática e eficiente para preservar a continuidade da atividade empresarial.
É fundamental que o contrato social especifique quem terá o voto de desempate e em quais tipos de decisão ele poderá ser exercido, a fim de evitar ambiguidades e futuras contestações.
Cláusula Shotgun (ou “Buy or Sell”): uma forma radical de resolução de conflitos
A cláusula de shotgun, também conhecida como cláusula de “Buy or Sell” (compra e venda), é um mecanismo contratual que visa resolver impasses severos entre sócios, especialmente em sociedades com participação igualitária, como as sociedades 50/50.
Essa cláusula funciona como uma espécie de “cartada final” para preservar a continuidade da empresa, e quando ativada, obriga um dos sócios a vender ou comprar a participação societária do outro.
- Um dos sócios (chamado de proponente) faz uma proposta irrevogável para adquirir a participação do outro sócio (o destinatário) por determinado preço.
- O destinatário então passa a ter duas opções: (i) aceitar a venda de suas quotas pelo preço proposto; ou (ii) comprar a participação do sócio proponente pelos mesmos termos e condições.
É uma estrutura que incentiva o proponente a fazer uma oferta justa, uma vez que poderá ser forçado a vender a sua própria participação pelo mesmo valor, caso o sócio destinatário opte pela inversão da proposta.
No entanto, por ser um mecanismo mais radical de resolução de conflitos, visto que resolve a disputa com a saída de um dos sócios da sociedade, a cláusula de shotgun deve ser utilizada com bastante cautela.
Métodos Extrajudiciais de Resolução de Conflitos: uma forma de preservar a sociedade de litígios prolongados
A possibilidade de utilização de métodos extrajudiciais de solução de conflitos societários constitui uma forma cada vez mais valorizada e eficiente para proteger o negócio contra os impactos negativos causados por disputas judiciais. Em sociedades 50/50, onde o risco de impasses e desentendimentos é naturalmente maior, essa possibilidade se torna ainda mais relevante.
É necessário constar no contrato social a previsão para que os sócios possam optar por métodos alternativos de resolução de conflitos. Essa é uma forma célere e eficiente para resolver divergências e preservar a continuidade da empresa, evitando o desgaste e a exposição que um processo judicial poderia acarretar.
Os principais métodos extrajudiciais aplicáveis são:
- Mediação: é um meio consensual de resolução de conflitos, no qual um terceiro imparcial – o mediador – auxilia as partes a chegar a uma solução para a controvérsia. Esse é um método muito interessante, pois preserva a autonomia das partes (o mediador não impõe uma decisão), a confidencialidade (as tratativas são protegidas pelo sigilo) e a celeridade (os procedimentos são, em regra, muito mais rápidos processos judiciais ou arbitrais).
- Arbitragem: é um meio de resolução de conflitos onde as partes transferem a decisão da controvérsia para um ou mais árbitros escolhidos pelas próprias partes, ou nomeados de acordo com as regras da câmara arbitral. Esse é um método interessante se os sócios estiverem buscando por equivalência jurisdicional, uma vez que a sentença arbitral tem o mesmo efeito de uma decisão judicial. Além disso, é bastante valorizado pela especialização técnica dos árbitros, ou seja, aqueles que trarão uma solução para a disputa são especializados na matéria. A arbitragem também preserva a celeridade e o sigilo das partes.
Diferentemente do que ocorre na mediação, a arbitragem é mais procurada para a resolução de conflitos com maior complexidade e que envolvam valores expressivos. Mas, é necessário avaliar os custos, pois não costuma ser um procedimento barato.
Conclusão
Sociedades 50/50 exigem uma atenção especial para sua governança, bem como a análise e previsão de mecanismos que possam garantir, na prática, a continuidade do negócio diante de conflitos inevitáveis. A igualdade de participação societária, por si só, não garante equilíbrio nas decisões, e a ausência de instrumentos capazes de resolver impasses pode acarretar prejuízos irreversíveis, tanto para a empresa quanto para os sócios.
Antecipar soluções no contrato social e no acordo de sócios, como o voto de minerva, a cláusula de shotgun e a previsão de métodos extrajudiciais de solução de conflitos, é uma prática altamente recomendável para todos os empreendedores que desejam proteger o seu negócio e manter a relação societária estável.

Tatiana Araújo
Advogada Empresarial. Especialista em Direito Digital, Contratos e Societário. Mais de cinco anos de experiência em assessoria jurídica estratégica para negócios digitais.